Algo Turvo


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Carta a Lamarck Augusto

À nós humanos como um todo finda assim: quase todo sentimento separa.
No final é mais a dor que nos une, mais primorosamente.
Então sobre eu e ti é também fato que estamos presos um noutro,
já que daqui a quarenta, trinta, penso que é inevitável que vá sentir tal como senti.
E exatamente vão lhe submeter a doer as mesmas dores que eu doí.
A nós humanos como um todo, vamos nos equiparando as sensações, aos poucos.
Cada qual no seu tempo, quando não há contratempos fatais de outras naturezas.
Pra constar, então enfatizo que primo por me vigiar sobre mentir pra mim mesmo,
principalmente sobre os paradigmas desse gueto moderno ao qual tu pertence, onde
se finge e
se mente
e constantemente se cria relativizações
pra se gozar o próprio gozo: uma coisa humana das mais representativas, aliás.
Também enfatizo que é claro que vez ou outra eu me remeto também ao quão simples e rápido é pensar
nesse viés de que se formos todos prioritariamente paternais o mundo está a salvo.
Mas eu não acredito nesse perdão idealizado. O utópico perdão supremo.
Mas concordo em sermos paternais sobretudo.
Porém, a curto prazo, não o somos, tão pouco queremos.
Sobretudo por que doer é bom, fazer doer também.
Sobre a raiva, essa necessidade estranha que a gente esconde,
esse prazer estranho que não se entende e que dá medo,
nisso talvez eu force uma justificativa
de por onde caminho pra não querer lhe ver de nenhum modo.
Vai paralelo ao motivo óbvio de que tens muito pouco a me oferecer:
somente o que posso encontrar em qualquer lugar.
Então, deixe cada coisa no seu tempo. Cada insistência, abstração.
Presunçoso, infelizmente já sei de cor como esse rio corre.
Eu nem teimo comigo,
Como suponho que não teimas consigo também.
Mas as minhas apostas são tão comedidas.
Lá pelos oitenta daremos as mão sem quase pensar -
ou o que eu poderia chamar de uma hierarquia mais evoluída de pensar.
Por que é ali que se alcança a paz maior.
Sabe a paz que alguns velhinhos tem no olho?
Aquilo não é só cansaço.